quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

O que Aprendi com os Toureiros

Fim de ano é sempre repleto de fechamentos ... encerramentos. Alguns, passando pela angústia de uma defesa de dissertação ou tese, se desesperam: quase se colocam no lugar dos perus ... hehehehe.

Depois que eu passei pela minha, escrevi um texto pra ajudar um amigo - ele não precisava, mas eu quis dar uma força. Quem achar legal, à vontade.

O Que Aprendi Com os Toureiros

guia prático-consolativo para defesas com banca

1. El buen toro es bravo y noble. O touro entra na praça para matar o toureiro, para defender um território. E quanto mais ele luta, melhor é. Mas ele não olha para o toureiro, senão para a capa (os enganos). Um touro bravo e que segue a “muleta” é, portanto, o touro “ideal”.

O examinador leu o seu trabalho e não deve ir à defesa para acariciar-lhe. Ele tem a obrigação de discutir o seu trabalho com você, assim como o touro de lutar contra o toureiro. Mas é o toureiro quem ensina, nos poucos minutos que tem, o touro a ir pela capa. Desta mesma maneira, você deve manter o foco da argüição no trabalho: ele é a sua capa.

2. Los toros son sorteados. Cada toureiro mata, normalmente, em uma tarde, dois touros, alternando com outros dois toureiros (em uma tarde de touros, portanto, geralmente são mortos seis touros). Na defesa, só há você, mas normalmente são dois examinadores (mais o seu orientador). Mas você tem uma vantagem: você escolhe seus examinadores. O toureiro não: seus touros são sorteados com os outros lotes e repartidos pelos companheiros de cartel.

3. A un toro, sólo se le conoce en la Plaza. Da mesma maneira, só se conhece o examinador na hora da defesa. Portanto, freqüente as defesas, principalmente de futuros membros das bancas. Aproveite, ainda, o(s) exame(s) de qualificação não só para aprimorar o trabalho, mas também para conhecer e, principalmente, confiar nos examinadores futuros.

4. El matador tiene su cuadrilla. Ninguém mata um touro sozinho. Cada matador de touros tem uma equipe, geralmente com banderilheiros, picadores, mozo de espadas etc. Peça para amigos revisarem partes do seu trabalho e tente lê-lo como se fosse de outro. Peça ajuda e fundamentalmente, confie em seu orientador. O toureiro que não confia em sua “cuadrilla” não toureia. Você tem que estar seguro da capacidade de seu orientador em defender o seu trabalho até o fim, inclusive politicamente, se ele gerar polêmica ou não for do agrado de setores do departamento.

5. El matador sólo piensa em sus toros. O matador conhece a procedência dos touros que vai enfrentar, suas características principais, provenientes de sua árvore genealógica etc; e também conhece seus próprios limites. É bom que você conheça quem são os seus examinadores. Leia textos deles. Conheça-os. E conheça o seu próprio limite. Não tenha medo de dizer “eu só vou até aqui com isso”. O matador tem o seu próprio medo da morte como limite. Você, o seu conhecimento e a sua capacidade de manter o foco da discussão no seu trabalho.

6. Cada matador tiene su concepto de toreo. E só quem sabe a melhor lida do touro é quem está diante dele. E deve ser respeitado. Da mesma maneira, você está dando a sua visão de mundo, mais ou menos individual e você tem o direito de se expressar. Use a liberdade de expressão para dizer o que você pensa do mundo, mas não se esqueça que um toureiro que traz o touro mais perto corre mais risco.

7. El buen matador conoce las fases de la lídia. O touro entra na praça, é picado, banderilhado e depois vai ser morto. O sistema fim da tourada é a morte do animal. E tudo é importante para que o matador lhe mate de acordo com o regulamento. Dessa mesma maneira, o trabalho científico tem um “regulamento”. Um método. Tente (entender e) respeitar o “jogo de convivência” com o leitor. Faça uma “boa introdução”, uma boa fundamentação teórica, exposição etc. Tente relacioná-las como partes de um organismo vivo. Ajudará na compreensão do trabalho.

8. Nadie se pone delante de un toro sin saber torear. Antes de matar touros, o matador mata bezerros, novilhos etc. Da mesma forma que ninguém pega uma toalha de mesa e pula no ruedo de Las Ventas, em Madri, ninguém deve ir para uma defesa sem um mínimo de conhecimento de causa. Tente, desde as disciplinas de graduação, participar de seminários, apresentações; estudar, enfim. Faça o TCC, o Mestrado e depois o Doutorado. Sou contra o Doutorado direto. Prepare-se.

9. El matador tiene que estar mentalizado. E você também! Já estudou tudo, fez um trabalho – o melhor que pôde (espero!) – etc. Agora é esperar, sabendo el que uno lleva dentro.

10. El matador se juega la vida. O matador de touros, principalmente (porque todos os que trabalham com touros são toureiros, mas o matador é o principal) está sempre correndo risco de morrer. É ele que enfrenta os touros cara-a-cara. É você que vai enfrentar a defesa. Portanto, a última coisa que você pode é ficar nervoso ou inseguro em cima da hora: o máximo que vai acontecer é você ter que arrumar o trabalho. Ao chegar à defesa, muitos poucos morrem na praia.

11. El matador tiene que lucirse. Não basta matar os touros ... há de se cortar os troféus (uma orelha, ou duas orelhas, ou duas orelhas e o rabo). Não basta defender o trabalho ... é bom não deixar de responder nada. Nem mesmo às colocações dos examinadores. A sua capacidade de discutir também conta muito, principalmente se você – humildemente e com verdade – mostra o seu limite e vai até ele. E faça uma boa apresentação que explique, por outra via, o que você fez.

Espero que seja de uso.

São José de los Campos, junio de 2006


Bom café. Vou me preparar pra mais uma tarde de toros (apresentação na escola da Virga).

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